JIM

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segunda-feira, dezembro 19, 2005


O meu segundo romance sobre Angola:
"O CAMACOVO, CAMACOVE OU CAMACOWE (CFB)" será, para sempre, uma das referencias mais emblemática de Angola, de todos os tempos.
Introdução


Trata-se de um romance de ficção baseado em extractos de vivência do autor - enquanto Furriel Miliciano na 14 ª Companhia de “COMANDOS” – nos anos de 1967 a 1970, no decorrer da guerra colonial em Angola. Embora ficcionado, o romance retracta alguns factos desse período: (“Tirem-me daqui!...”), era frequente ouvir-se em desespero de causa. Da dificuldade de compreensão por parte dos que foram obrigados a pegar em armas, por razões duvidosas, contra organizações suspeitas. No terreno, em contacto com a realidade, só encontrávamos ostracismo e miséria a que as populações tinham sido votadas. Esse desprezo e esse abandono já eram nossos conhecidos da metrópole. Muitas vezes abordados por nós – militares de vinte, vinte e um anos – evangelizados até à medula e intencionalmente despolitizados. A luta pela liberdade contra a tirania é ancestral na história da humanidade: "de um lado as minorias, detentoras dos privilégios e do poder; do outro as maiorias – constituídas pelos pobres, pelos os humildes – sustentáculos dos todo-poderosos e das suas hipocrisias"
Era estranho, que naquela guerra só houvesse meninos «Zés-ninguém» como eu. Independentemente dos postos que ocupavam: "Soldados; Cabos; Furriéis; Alferes; Capitães – todos milicianos –, fossem filhos das classes mais pobres dos que não tinham podido comprar a liberdade e fuga à guerra". Os filhos dos ricos, dos poderosos – salvo raras excepções – não foram tão patriotas. Escolheram fugir para o estrangeiro, ou continuarem os seus eternos cursos superiores. Muitos angolanos ricos, ou privilegiados, também não fizeram a guerra nem a oposição. Alguns estavam na metrópole, à sombra da bandeira nacional, onde a tropa era apenas de alguns meses. Mais tarde chegaria à conclusão que isso lhes havia sido duplamente vantajoso: porque não fizeram parte do milhão de militares envolvidos na guerra do ultramar; nem na lista dos cerca de onze mil mortos que a mesma originou – pela parte portuguesa; nem dos milhares de civis angolanos e portugueses vítimas no início e durante as hostilidades. Curiosamente, hoje são os heróis, porque não lutaram a favor dos colonialistas nem dos terroristas. Acabaram os seus cursos superiores e, através dos partidos políticos, são actualmente: os dignos representantes dos cobardes que fizeram a guerra contra os seus irmãos de além-mar. Representam o povo no parlamento, com as mesmas convicções dos anteriores ditadores: como deputados; membros de vários governos; à frente das principais instituições. Auferem chorudos ordenados, com reformas vitalícias ao fim de meia dúzia de anos de “mandatos.”
Os cobardes que fizeram a guerra contra os seus irmãos de além-mar – que eles nos perdoem –, transtornados com doenças de todo o género provocadas por essa mesma guerra, transportam consigo os estigmas: do matar para não ser morto, do não matarás, porque se a arma que mata for para defender a paz; “os Anjos choram mas não condenam.” Esses, não têm direitos... Ontem, tal como hoje, não mandamos na nossa terra. A justiça, a saúde, o ensino, a liberdade de pensamento são só para alguns. Os hipócritas, que abandonaram o barco quando o país os chamou, esses; têm direitos.
Não é lícito que, só ao bom povo – tanto de Angola como de Portugal –, seja assacado a responsabilidades da exploração da Santa Pátria Angolana; das suas riquezas, das suas gentes. Onde entra a responsabilidade da “Hierarquia da Igreja” (da Religião Católica Apostólica Romana), no meio de tudo isto? Quando os seus mais altos dignitários, antes dos embarques, nos liam excertos como este: (“...Quando a arma que mata serve para defender a paz, os anjos choram mas não condenam...”)
É lícito, justíssimo, prestar homenagem póstuma a todas as vítimas negras e brancas de Angola e de Portugal. A todos os mutilados, aos que sofreram os horrores da guerra. Muito honestamente, pela degradação a que as coisas haviam chegado, sempre pensei que pudesse haver uma revolução em Portugal. Nunca pensei que surgisse dos militares, mas sim dos ex- militares. Com uma experiência acumulada, de treze longos anos de guerra, jamais consentiriam - quando regressassem às suas terras de origem que as arbitrariedades continuassem. Mas não: a revolução surgiu, justamente, de um dos sectores mais conservadores da nossa sociedade. Surgiu de uma classe – os militares – por se sentirem injustiçados reivindicavam na altura: aumentos de ordenados e outras regalias que uns tinham e outros não. Não deixa de ser curioso não obstante ter servido para que a Pátria enterrasse alguns fantasmas do passado; mas não todos. Sinto-me traído, usado, pelo estadismo de ontem e o liberalismo triunfalista de hoje. Ambos têm em comum o abandono das populações. O povo português, enquanto sujeito da história, nunca mereceu qualquer respeito por parte dos seus governantes. Nos momentos difíceis eu e os meus colegas interrogávamo-nos: ("Onde estão os filhos dos ricos e dos poderosos; porque compraram eles a liberdade e nós não; porque permitia o sistema tal procedimento, tal arbitrariedade?...) Hoje, somos nós os criminosos. Porque não tivémos dinheiro – ou condição social – para comprar a liberdade e fuga à guerra. Para nos cobrirmos com a desculpa de sermos estudantes, ou hipocritamente nos misturarmos com os funcionários de empresas de retaguarda, onde os filhos dos ricos - a troco de muito dinheiro - se escudaram: como no caso das (OGMA) – Oficinas Gerais de Material Aeronáutico – em Alverca. Este com plexo militar, da Força Aérea, chegou a ter – à sombra da bandeira nacional – efectivos de seis mil funcionários durante o tempo de guerra. Consta, que alguns iam de «Porsches» para o “trabalho”. A exaltação à Pátria a qualquer preço, os chorudos proventos tirados do esventrar da terra, da mão-de-obra escrava até ao seu aniquilamento enquanto fonte de riqueza, ou até; à revolta desesperada dos seus naturais. As consequências destes actos nunca foram contabilizadas: nem com a Pátria; nem com os povos negros e brancos de Angola e de Portugal; nem com os novos Países de expressão portuguesa (ex-colónias portuguesas), povos nossos irmãos por força de contingências históricas, bem claras.
Este livro não é, de forma alguma, uma demonstração de antipatriotismo do autor. É antes, uma tentativa de alerta contra todas as formas discricionárias e hipócritas dos todo-poderosos que, a pretexto de determinados valores, se perfilam sempre: atrás de símbolos; de organizações marginais; do poder económico, político e religioso. O autor dedica esta obra a todos que, se identificam com ela, através do reconhecimento pelos cheiros, pelas sensações, pela pureza e simplicidade das gentes. Beija a Santa Terra de Angola, a grande metrópole, a mãe de todas as Pátrias. A grande casa da língua portuguesa ajoelha perante ti – Angola – e pede-te perdão: pelos eventuais excessos cometidos por mim, pela minha gente e pela minha Pátria.




«Angola foi o grande amor da minha vida, Luanda a minha eterna namorada»

Lisboa, Setembro de 2002

José Madaleno




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